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O melhor canto do salão

Uma parte das forrozeiras estão sempre estudando o melhor canto do salão

Deborah Goldemberg

Uma parte das forrozeiras estão sempre estudando o melhor canto do salão. Apesar da revolução de gênero e da maioria já tirar os rapazes para dançar, ainda predomina a modalidade – rapaz-tira-moça. Assim, ao longo da noite, ouvimos as amigas dizerem, “Vamos para o outro lado da pista?” ou “Aquele canto está melhor hoje” ou “Prefiro ficar perto do palco” e, assim, vamos nos deslocando pelo salão em busca de boas danças. Mas, será que há mesmo um lugar melhor do que o outro no salão?

Para iluminar o tema dessa crônica, entrevistamos a especialista em melhores cantos na pista do forró: Sra. Maria Bonita Forrozeira. Essa querida dança forró há noventa e cinco anos, já dançou em Petrolina, em Itaúnas, em Ouricuri, até no Jaçanã ela já dançou forró! Sua teoria é que há duas tendências gerais: i) se você ficar encostada na pilastra, ninguém te tira para dançar, ii) se alguém te tira para dançar e for aquela dança que chama a atenção de todos, você não para mais de dançar. Simples assim.

Ou seja, ser tirada muito para dançar tem a ver com você já estar dançando à beça. Tipo a história de que gente rica atrai dinheiro! Então, forrozeiras, o negócio é o seguinte: quando chegar no forró, não fique acanhada. Mire o dançarino mais vistoso que tiver na pista e tire ele para dançar. A partir daí, você não para mais. Os outros vão ver que você é bonita, é sestrosa, sabe dançar, requebra, balança os cabelos, roda bem uma saia e lacrou.

Atenção caso você vá banheiro ou queira beber uma chiboquinha! Quando você voltar à pista, terá que retomar do início. Porque na sua ausência o ecossistema do salão pode ter se reconfigurado. Alguns dançarinos se movimentam para o outro lado do salão (os azes da pista, que gostam de rasgar o salão…), outros foram fumar um cigarro e, daí, o registro de você brilhando se perde e você corre o risco de mais chá de pilastra.

A psicologia por detrás disso, a gente vai entender com a ajuda da psicóloga forrozeira Sra. Freudiana Forrozeira. O que explica isso, doutora? “Após concluir meus estudos em João Pessoa, Paraíba, e na Sorbonne V, Paris, a conclusão é que o ser humano sempre quer o que o outro já tem!” “E precisava estudar tanto para saber isso, doutora? “A grama é mais verde na casa do vizinho”, já dizia meu tataravô. “Sim, sempre queremos o que o outro tem, quando estamos desconectados do nosso próprio desejo.” Ahhh….

O que significa preferir a rosa mais vermelha que gira no salão? A indisposição de desvendar o valor intrínseco da moça encostada na pilastra? De se surpreender, eventualmente. Ver desabrochar uma flor singela? Da mesma forma, o que isso diz das moças que querem dançar com os dançarinos mais amostrados? Fritarão na fogueira de vaidades? Desejando sempre a conquista do outro? Prestando reverência ao que os olhares dos outros dizem de você?

Depois de entender a mensagem de Dra. Maria Forrozeira, às vezes, me desloco para o canto mais obscuro do salão. A teoria dela é infalível. Ninguém me tira para dançar. Uns rapazes passam, me olham e desviam. Outros ficam sem jeito, cumprimentam e seguem. Guardo meu segredo no peito e penso no quanto isso também se aplica à vida em geral. Quantas pessoas preciosas não ficam encostados nas pilastras da vida e nem as vemos, ofuscados pelas rosas e cravos mais chamativos? Fica a dica aos forrozeiros e a todos nós, na pista e no dia a dia.  

Crônicas Forrozeiras

Descrição da Coluna:
Forrozeiro que é forrozeiro vai ao forró toda semana, às vezes até todos os dias! Uma vez na vida, ao menos, precisa conhecer Itaúnas, a “Meca” do forró pé de serra, mas os fiéis mesmo vão todo ano dançar forró nas dunas! Sendo assim, o universo forrozeiro é repleto de rituais sobre o estilo da dança, as bandas favoritas, os modos de vestir e calçar – de regatas e “chinesinhas”, as preferências e desagrados no dancing, as bebidas mais amadas como a catuaba (e aquelas que nenhum forrozeiro bebe – como o uísque!), o cigarrinho na pausa, enfim. Pode-se dizer que o forró sudestino é uma sub-cultura ou uma “tribo” urbana. É sobre esse universo que se debruçam as crônicas forrozeiras, revelando seu charme e alguns de seus segredos. Esse gênero literário despretensioso que passeia pelos detalhes do cotidiano e sempre toca a alma dos que ali vivem. Venha nos descobrir! 
Por quem:
Deborah Goldemberg é antropóloga e escritora, além de forrozeira, é claro! Autora de romances como Valentia (Ed. Grua, 2012) e A Brecha, Uma Reviravolta Quilombola (Ed. Estrela, 2020), finalistas do Prêmio Jabuti e Machado de Assis, a autora é fã de crônicas, que publica no seu site deborahgoldemberg.com com direito a podcast para quem prefere ouvi-las. Em 2022, escreveu a peça Forró for All – forró sudestino no coração do Largo da Batata, que conta a história do surgimento do forró universitário na cidade de São Paulo. A peça estreou em Março de 2023 no Teatro B32 e, atualmente, uma versão “Pocket” segue marcando presença em festas forrozeiras por toda a cidade, com a banda Forró for All e corpo de baile.

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