CrônicasDestaques

Existe amor no Forró?

Por Deborah Goldemberg

Nada é mais chocante para um forrozeiro do que se deparar com um “ex” aos beijos com outro alguém no dancing. A gente sabe que vai acontecer um dia, que a fila anda e tals, mas quando acontece dói. Pelo fato em si, mas é pior por ser no mesmo lugar em que rolou o apaixonamento, se comemorou mesversários e aniversários. Há algo em vê-los na mesma situação em que tantas vezes estivemos, dançando ao som dos mesmos forrós, fazendo os mesmos giros e, até, usando as mesmas roupas com as quais foram feitas juras de amor eterno que nos deixa forrosados (versão forrozeira de arrasados!).  

Quando aconteceu comigo, o episódio suscitou uma crise forrózistencial. Questionei: existe amor no forró? Ou os encontros que se dão no dancing são uma sequência de paixões em que um corpo substitui o outro no êxtase forrozeiro. Será que o forró é apenas um lugar propício demais para nos sentirmos enfatuados e confundimos isso com estarmos enamorados? De fato, me dei conta, eu não tinha sido nem a primeira e nem a segunda namorada de forró do meu “ex”. Talvez, em vinte anos de forró, não sei se garantiria nem a posição trinta e cinco na lista! Ai, ai. Como me senti pouco especial…

Para elaboramos uma tese sobre o amor no forró precisaríamos ter uma definição clara de amor, o que é ambicioso demais para uma crônica forrozeira. Mas, minimamente, para falar de amor, precisaríamos estar falando de algo um pouco menos premeditado e previsível, certo? Algo diferente do que um amigo atualmente recolhido do forró rememorou como, “Ah, o forró era a minha principal fonte de namoradas” ou o que um produtor de forró me confidenciou, “O forrozeiro padrão quer dançar, beber e transar.” Ô forró, será que és um mero traficante de emoções baratas para almas penadas?

Senão o forró, qual será o lugar do amor verdadeiro? A Leroy Merlin, onde casais que constroem casas juntos empurram carrinhos gigantes e se endividam? As salas de espera dos laboratórios, onde os companheiros aguardam pacientemente chamarem a senha dos exames? A Cobasi, onde almas gêmeas decidem o melhor tipo de areia para seus pets mijarem? Ou a Playland, onde os já pais suportam níveis de decibéis acima do tolerável ao ouvido humano enquanto seus filhos pulam em piscinas de bolinhas plásticas repletas de meleca? Se é assim, será que o amor vale a pena? Rs.

É fato que quando baixa no forró um casal muito com “cara de amor eterno”, daqueles que já ficaram até parecidos um com o outro e usam tênis da mesma marca, eles parecem logo entediados. Dançam um pouquinho, depois encostam no bar e logo se voltam para seus celulares. Outro dia, tinha um casal bonito de ver no Remelexo, mas lá pela meia-noite me deu até vontade de tirar ele para dançar para ver se causava uma DR para animar o baile e, quem sabe, um sexo de reconciliação mais tarde. Ai, ai, a tal felicidade perene. Quem aguenta?

Não vamos chegar a conclusão nenhuma aqui, certo? Amor verdadeiro é raro em qualquer lugar e, também, é raro no forró. Se o amor que há dura muito ou pouco, sabe-se se lá se é mais ou menos amor? Se é precedido por outro amor ou se outro vem na sequência, vai da sorte ou habilidade de cada um, né não? Basta torcer para termos a sorte de ir de amor em amor igual a um macaco bugio vai de galho em galho. Para falar a verdade, não há lugar mais propício para se tentar isso do que o forró! Então, amor por amor, barato ou verdadeiro, que venha para a gente no forró dessa noite!

Crônicas Forrozeiras

Descrição da Coluna:
Forrozeiro que é forrozeiro vai ao forró toda semana, às vezes até todos os dias! Uma vez na vida, ao menos, precisa conhecer Itaúnas, a “Meca” do forró pé de serra, mas os fiéis mesmo vão todo ano dançar forró nas dunas! Sendo assim, o universo forrozeiro é repleto de rituais sobre o estilo da dança, as bandas favoritas, os modos de vestir e calçar – de regatas e “chinesinhas”, as preferências e desagrados no dancing, as bebidas mais amadas como a catuaba (e aquelas que nenhum forrozeiro bebe – como o uísque!), o cigarrinho na pausa, enfim. Pode-se dizer que o forró sudestino é uma sub-cultura ou uma “tribo” urbana. É sobre esse universo que se debruçam as crônicas forrozeiras, revelando seu charme e alguns de seus segredos. Esse gênero literário despretensioso que passeia pelos detalhes do cotidiano e sempre toca a alma dos que ali vivem. Venha nos descobrir! 
Por quem:
Deborah Goldemberg é antropóloga e escritora, além de forrozeira, é claro! Autora de romances como Valentia (Ed. Grua, 2012) e A Brecha, Uma Reviravolta Quilombola (Ed. Estrela, 2020), finalistas do Prêmio Jabuti e Machado de Assis, a autora é fã de crônicas, que publica no seu site deborahgoldemberg.com com direito a podcast para quem prefere ouvi-las. Em 2022, escreveu a peça Forró for All – forró sudestino no coração do Largo da Batata, que conta a história do surgimento do forró universitário na cidade de São Paulo. A peça estreou em Março de 2023 no Teatro B32 e, atualmente, uma versão “Pocket” segue marcando presença em festas forrozeiras por toda a cidade, com a banda Forró for All e corpo de baile.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *